terça-feira, 30 de julho de 2024

Após ameaças do traficante Peixão, igrejas católicas fecham as portas no Complexo de Israel, diz irmandade


06/07/2024 - G1 Rio e TV Globo

Por Rafael Nascimento e Jefferson Monteiro

Traficante se diz evangélico. Os templos afetados são as paróquias de Santa Edwiges e de Santa Cecília, em Brás de Pina, e Nossa Senhora da Conceição e Justino, em Parada de Lucas. Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância investiga o caso.


Igreja de Santa Edwiges fechada neste sábado (6)
Foto Arquivo pessoal


Depois de proibir terreiros de matrizes africanas, o traficante Álvaro Malaquias Santa Rosa, conhecido como Alvinho ou Peixão —que se diz evangélico—, decidiu que as igrejas católicas de Brás de Pina e Parada de Lucas, na Zona Norte do Rio, não poderão mais celebrar missas, casamentos ou batizados. A denúncia é da irmandade das igrejas católicas dessas paróquias.

Peixão está foragido. Contra ele, há ao menos 9 mandados de prisão por crimes variados.

Neste final de semana, as missas e eventos, como festas juninas e homilias, foram canceladas.

As igrejas afetadas são as paróquias de Santa Edwiges e de Santa Cecília, em Brás de Pina, e Nossa Senhora da Conceição e Justino, em Parada de Lucas.


Aviso de atividades canceladas na Paróquia Santa Cecília
 Foto Reprodução


Segundo católicos, motoqueiros armados com fuzis, que estariam cumprindo ordens de Peixão, foram nesta sexta-feira (5) às paróquias e ordenaram que não fossem realizados casamentos ou batizados.

Sem citar o caso, a Paróquia de Santa Edwiges usou suas redes sociais para anunciar o cancelamento de sua festa julina e das missas neste fim de semana.


Mensagem nas redes sociais da Paróquia Santa Edwiges 
Foto Reprodução


“Comunicamos que nosso arraiá está suspenso neste fim de semana. Não teremos Santa Missa e atividades em nossa paróquia também. Igreja fechada. Em breve, retornamos com mais informações”, informa a mensagem.

Já nas redes sociais da Paróquia Nossa Senhora da Conceição e Justino, em Parada de Lucas, os administradores escreveram:

"As atividades paroquiais (missas, reuniões, secretaria, etc) estão suspensas até a segunda ordem".


Aviso postado nas redes sociais da Paróquia Nossa Senhora da Conceição e São Justino
Foto Divulgação


De acordo com fiéis, o caso teria sido levado ao comando do 16º BPM (Olaria), responsável pelo policiamento na região, mas nenhuma medida teria sido colocada em prática.

Polícia Civil disse que a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) investiga o caso. Apesar dos avisos postados, a Arquidiocese do Rio informou que as igrejas permanecem abertas.

A Secretaria de Segurança Pública do RJ também disse que as paróquias estão funcionando e informou que o policiamento segue reforçado na região (veja a nota completa mais abaixo).

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Polícia investiga denúncias de que igrejas teriam sido obrigadas a fechar em Brás de Pina

A história de Alvinho, hoje Peixão

Em meados de 2016, Alvinho estava obcecado com uma ideia: “Libertar o povo da Alta”, como é chamada a comunidade da Cidade Alta.

Durante meses, só pensava num jeito de tomar o controle daquele conjunto habitacional em Cordovil, Zona Norte, vizinho a Parada de Lucas, favela que o traficante já controlava com uma receita básica: assistencialismo e mão de ferro.


No alto da Cidade Alta, na Zona Norte do Rio, os criminosos colocaram uma estrela de Davi 
Foto Reprodução


Alvinho, hoje conhecido como Peixão, é o idealizador e chefe do Complexo de Israel, um conjunto de favelas na Zona Norte. Há quase uma década, é Peixão quem dá as cartas na região. Em 2016, ele deixou passar as Olimpíadas do Rio, para não chamar a atenção da polícia, e invadiu a Cidade Alta.

Aos poucos, foi expandindo seus domínios para as favelas vizinhas, como Pica-Pau e, mais recentemente, a Cinco Bocas, formando com Parada de Lucas e Vigário Geral o Complexo de Israel.

Peixão foi criado pela mãe, umbandista, que recebia santo (o Erê) vestida de branco, comia pipoca e doces de criança na esquina da Avenida Brasil.

Hoje adota e prega um discurso de “povo escolhido”. Mandou colocar a Estrela de Davi no topo da Cidade Alta e desenhou as bandeiras de Israel por toda parte. Seu bando passou a ser chamado de Tropa do Aarão.


Peixão mandou tirar a imagem da santa ao lado de campo de futebol na favela Cinco Bocas
Foto Reprodução


A influência evangélica fez também com que as favelas fossem desenhadas com passagens bíblicas. Na esteira disso, veio a intolerância religiosa. Terreiros foram proibidos e imagens de santa retiradas (veja na imagem acima).

O traficante já foi investigado por ordenar ataques a terreiros de religiões de matriz africana, através da atuação do Bonde de Jesus em Duque de Caxias, onde nasceu. Ele mesmo pregava em uma igreja evangélica no município, como contou o g1 em 2019.


Traficante Peixão frequentando uma igreja
Foto Reprodução


Nota da Secretaria de Segurança Pública do RJ

"A Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro esclarece que as paróquias Santa Edwiges e Santa Cecília, em Brás de Pina, na Zona Norte da capital, estão abertas e com a segurança reforçada pela Polícia Militar. É importante ressaltar que não houve intimidação ou qualquer tipo de comando de traficantes para fechar as igrejas e que essa informação surgiu de boatos em redes sociais.

As forças policiais do Estado vêm realizando operações na região para retirada de barricadas e para aumentar a segurança da população, rotineiramente, há pelo menos dois meses. O blindado da Polícia Militar está baseado na localidade para evitar a retomada da instabilidade na região, garantindo o funcionamento das paróquias e a segurança dos moradores."

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